16/10/2019 – Extraído de assemae.org.br
Entenda porque a proposta fulmina a titularidade dos municípios e desestrutura os serviços públicos.
Nota da Assemae sobre o Substitutivo do PL 3261/2019, que altera a Lei do Saneamento
A Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (Assemae) vem a público manifestar sua posição contrária sobre o Substitutivo do Projeto de Lei 3.261/2019, apresentado pelo deputado Geninho Zuliani, com o objetivo de alterar o marco legal do saneamento básico. O texto fulmina a titularidade dos Municípios, interfere na autonomia dos prefeitos e desmonta a estrutura dos serviços públicos do setor, aniquilando o arranjo institucional definido pela Carta Magna brasileira.
Ao fragilizar a operação dos serviços públicos, o Substitutivo não oferece alternativas factíveis para a universalização do saneamento básico no Brasil. Pelo contrário, se preocupa apenas em aumentar a participação da iniciativa privada e colocá-la como salvação do setor, mesmo que isso signifique o fim dos prestadores públicos.
É evidente que a proposta demonstra a falta de compromisso do Governo Federal com as políticas públicas de saneamento básico, uma vez que pretende repassar para a iniciativa privada a competência pela aplicação dos investimentos do setor, ainda que os recursos venham de fontes públicas, tais como os recursos do FGTS. A Assemae considera que a universalização do saneamento requer o comprometimento dos três entes da Federação, a partir de investimentos permanentes em ações estruturais e estruturantes. Tratar o saneamento com prioridade significa reconhecer e multiplicar os modelos de gestão eficientes, e não, simplesmente, mercantilizá-los.
Titularidade dos Municípios
O Substitutivo do PL 3.261/2019 representa o fim da titularidade municipal no setor de saneamento básico, contrariando o que estabelece a Constituição Federal Brasileira, que assegura a titularidade dos Municípios nos casos de serviços públicos locais e essenciais. Este imbróglio, certamente, provocará a judicialização da lei em todo o País e aumentará a insegurança jurídica, comprometendo a universalização do saneamento brasileiro.
As definições de interesse comum e interesse local confundem o exercício da titularidade com a função do prestador do serviço. Ao apresentar os serviços de interesse comum como aqueles que atendem a mais de um Município ou sejam confluentes, a proposta ignora situações práticas, a exemplo dos casos em que os titulares captam água de um único rio mesmo estando em territórios diferentes, ou na destinação de resíduos sólidos depositada em um aterro de Municípios vizinhos.
Prioridade de Recursos
É inadmissível uma proposta que pretende priorizar o acesso a recursos federais para os municípios com serviços concedidos à iniciativa privada, nos casos de elaboração dos planos municipais de saneamento básico. A Assemae entende que o Substitutivo deve direcionar recursos para todos os Municípios brasileiros, independente da escolha do prestador pelos municípios.
Contratos de Programa
Os prefeitos e prefeitas do Brasil possuem o direito de escolher o modelo de gestão mais adequado para a realidade de seu Município, seja operar diretamente o serviço de saneamento, delegar para a companhia estadual ou conceder à iniciativa privada. O contrato de programa é o instrumento que garante ao gestor municipal essa opção de escolha, por isso, a Assemae defende a existência de contratos com regras claras e metas progressivas, capazes de viabilizar a universalização do saneamento básico segundo a realidade de cada Município. O fato é que a União não tem competência legal para obrigar o gestor municipal a seguir um caminho planejado por ela, sem que haja o consentimento e a participação social.
Alienação
Além de transformar todos os contratos de programa em contratos de concessão, a possibilidade de alienação do controle acionário dispensa a anuência do titular nas situações em que não ocorrer a alteração do objeto e dos prazos durante o processo de venda. Outra arbitrariedade é configurar a anuência do titular caso não haja manifestação no prazo de 180 dias. A regra não se aplica ao Direito público, até porque a ausência de manifestação também poderia ser interpretada como a não concordância com a proposta de alienação.
Regulação
A Assemae compreende a necessidade de estabelecer normas de referência para a regulação do setor de saneamento básico no Brasil. Entretanto, da forma como está, o Substitutivo do PL 3.261/2019 confunde a competência da Agência Nacional de Águas (ANA) com a autonomia decisória das agências reguladoras já existentes, ao mesmo tempo em que impõe a obrigatoriedade de diretrizes regulatórias nacionais, o que interfere na autonomia dos entes federados.
Diante deste cenário, Assemae – que representa 25% do setor de saneamento básico e reúne quase dois mil municípios associados – conclama o Parlamento Brasileiro para que rejeite o Substitutivo do Projeto de Lei 3.261/2019, ou condicione sua aprovação mediante a correção do texto.
Não é possível aprovar um novo marco legal que põe em risco a existência de serviços públicos notadamente eficientes. Na prática, só vamos alcançar a universalização do saneamento básico quando priorizarmos o avanço da governança corporativa, a implementação de recursos não onerosos, a ampliação da assistência técnica, a sustentabilidade dos modelos tarifários e integração com as demais políticas urbanas. Sendo assim, a Assemae não se furtará em defender a titularidade municipal e a gestão pública de qualidade, atuando a favor do acesso ao saneamento básico de forma justa e inclusiva.
Brasília, 15 de outubro de 2019.